A guerra por preços parece ser a única opção viável na disputa entre concorrentes – mas não é. Uma alternativa bastante eficiente é a “competição por valor”, conceito proposto pelo norte-americano Michael Porter – um dos principais nomes do mundo em estratégia de negócios -, pelo qual a disputa entre os agentes gera uma soma positiva, da qual todos podem se beneficiar. E essa visão se encaixa perfeitamente no setor de Saúde .
Ao escolher um hospital, clínica ou determinado serviço, o paciente tem o costume de considerar o aspecto do quarto e do prédio da instituição em vez de dados relacionados à assistência, como o desempenho dos médicos e indicadores de desfechos relacionados à sua doença.
E isso só acontece porque esses dados não estão acessíveis. A assimetria de informação impossibilita que o conhecimento chegue para todos, o que impede uma competição pelo que se faz, em vez de pelo que se oferece.
E como mudar esse cenário? Incentivando a competição por valor. Mas a competição por valor só faz sentido se a lógica de remuneração dos profissionais também for alterada.
Experiência bem-sucedida
Na competição por preços que estamos vivendo na Saúde, o foco do pagamento está no volume e complexidade dos atendimentos, fazendo com que a boa performance não seja nem incentivada, nem reconhecida. Mas, ao mudar o raciocínio, e passar a remunerar por valor, o prestador buscará entregar o melhor desfecho com o menor custo possível para que o sistema permaneça sustentável – algo bem mais importante do que um extravagante serviço de hotelaria de um hospital, concorda?
Esse modelo de competição por valor já é adotado em diferentes países, assim como começam a surgir alguns exemplos aqui no Brasil. Um estudo realizado nos Estados Unidos, por exemplo, abrangeu cirurgias para inclusão de próteses, basicamente de quadril e joelho, realizadas entre abril de 2016 e dezembro de 2018 nos Centers for Medicare & Medicaid Services’ (CMS) Innovation Center. O estudo comparou o impacto do modelo de pagamento no desfecho clínico entre dois grupos: um no qual os centros de Saúde tinham sua remuneração atrelada ao valor gerado não só durante a cirurgia, mas nos 90 dias que se seguiam, e outro, que mantinha o formato de pagamento por serviço. A taxa de complicações (-7,4%) e o valor médio de pagamento (-5,3%) caíram no primeiro grupo.
É verdade que esse modelo de remuneração transfere parte do risco para o hospital, mas também significa que, ao assumir a responsabilidade pelo resultado final, a instituição pode ver seu faturamento aumentar, pois a competição por valor trará mais pacientes ao hospital e ele passará a receber, também, pelo resultado alcançado no paciente. E é dessa forma que os hospitais devem concorrer entre si: ofertando serviços que geram mais valor às pessoas.
Dados para poder avaliar
Se a competição por valor só é possível num sistema que recompensa o valor gerado, medir e divulgar esse valor gerado se torna, portanto, crítico
Uma forma de fazer isso é a partir da medição a partir do Escore de Valor em Saúde (EVS), que analisa dados como desfecho clínico, processo, reporte do paciente e custo atribuindo uma nota, de 0 a 5, ao paciente e ao prestador. Isso é parte da estratégia para a adoção de um modelo de remuneração baseada em valor que vai revolucionar a forma em que o setor está hoje estruturado. Condicionar um pagamento variável ao valor medido pelo EVS é a parte fundamental para a mudança da lógica atual da remuneração.
E quanto maior a transparência interna, consequentemente maior será a transparência externa: mais as pessoas saberão quais organizações de Saúde entregam maior valor em sua jornada de cuidado e passarão a escolher esses locais para se tratarem.
Quando o que está em jogo é a vida das pessoas, o preço mais baixo não deve ser o único incentivo a ser levado em conta. Se os dados são transparentes, uma nova regra de competitividade deve surgir, impulsionando os agentes de mercado a “brigar” entre si por maior geração de valor. E é assim que um novo círculo virtuoso é criado, pelo bem da Saúde.